* Por Nice Affonso
Na última quarta-feira, 27 de setembro, no alto do Corcovado, sob os braços abertos do Cristo Redentor, a Cáritas Brasileira lançou a campanha mundial “Compartilhe a Viagem” — dedicada à sensibilização e à informação sobre imigração e refúgio, com o propósito de promover a cultura do encontro, para abrir espaços e oportunidades aos imigrantes junto às comunidades locais.
Membros da Cáritas Brasileira, o secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Dom Leonardo Steiner, o bispo diocesano de Nova Iguaçu e referencial da Cáritas no Rio de Janeiro, Dom Luciano Bergamin, o vigário episcopal para a Caridade Social, cônego Manuel de Oliveira Manangão, o Arcebispo do Rio de Janeiro, Cardeal Orani João Tempesta, o reitor do Santuário Cristo Redentor, Padre Omar Raposo e diversos refugiados e imigrantes participaram da cerimônia de lançamento no Brasil, na mesma data em que a campanha mundial foi lançada pelo Papa Francisco, no Vaticano. O Coral Uma Só Voz, composto por pessoas em situação de rua, cuidou da parte musical do evento.
A Vice-Presidente da Cáritas Brasileira, Irmã Lourdes Dill, foi a primeira a convocar, conforme o exemplo do embaixador da campanha, o Cristo Redentor, a acolher a todos de braços abertos:
— O Cristo Redentor nos acolhe e nos convida a esse grande mutirão mundial. O Brasil está de braços abertos, e a Cáritas, no coração da Igreja, com o Papa Francisco em grande sintonia conosco, caminhando com os refugiados e os migrantes do mundo. Esta é a segunda grande campanha mundial, que a Cáritas Internacional, junto com a Cáritas Brasileira, lança para sensibilizar os corações, as mentes, os sentimentos e, acima de tudo, a nossa consciência, diante dos grandes problemas sociais que o mundo hoje sofre, especialmente com tantos irmãos refugiados e migrantes que perambulam pelo mundo procurando espaço e dignidade de direito para morar, viver, trabalhar e sobreviver, destacou a religiosa.
O secretário-geral da CNBB, Dom Leonardo Steiner, diante da paisagem do alto do Corcovado, lembrou a realidade de tantos irmãos, que, em busca de dignidade, enfrentam desafios desconhecidos:
— Diante de nós está o mar aberto. E há tantas pessoas que precisam se lançar no mar aberto para encontrar horizonte, sem saber se vão encontrar terra firme. Terra firme significa casa, trabalho, emprego, ser bem recebido. E mar aberto tem uma significância extraordinária, que remete à incerteza da existência. E quantos irmãos e irmãs hoje vivem essa realidade. E é tarefa nossa sermos o porto, sermos a guarita. Essas pessoas deixaram família, deixaram terra e agora precisam se inserir em outra cultura, em outra mentalidade. O caminho, às vezes, é longo, é sofrido, de muita luta. É por isso que o papa Francisco tem insistido tanto em falar dos refugiados e imigrantes, porque ele sabe da dor e do sofrimento. E quer nos acordar para podermos ajudar no acolhimento e na partilha, destacou.
O Arcebispo do Rio de Janeiro, Dom Orani João Tempesta, lembrou sobre a importância de se estabelecerem novas leis migratórias, o que também é um objetivo desta campanha, e convidou à promoção da cultura do encontro:
— É possível nos darmos as mãos e abrirmos espaços e oportunidades aos imigrantes, que estão buscando dignidade para a sua vida. Precisamos estar abertos a conhecê-los, à troca de experiências, à multiplicação de saberes, para que, juntos, compartilhemos a vida de forma positiva. A experiência humana é uma vivência de ser acolhido e acolher. As mulheres e os homens migrantes precisam de inclusão e respeito. Sua mentalidade, seus valores, sua cultura e religião é que fazem deles sujeitos integrais, que possuem uma história de vida que não pode e nem deve ser descartada. O diálogo e a construção de relações de confiança entre a população migrante, as instituições e comunidades locais é imprescindível para o desenvolvimento de espaços de convivência intercultural e inter-religiosa, que podem colocar as bases para uma sociedade aberta, plural e mais humana. Compartilhemos a viagem de nossos irmãos, como autênticos protagonistas da Cultura do Encontro, pediu o Cardeal.
A refugiada Mireille Muluila, da República Democrática do Congo, contou como vivem os refugiados e imigrantes, citando as muitas dificuldades que enfrentam. E em entrevista exclusiva a este site, deu o seu testemunho:
— Eu vim para cá, há três anos, porque no meu país há guerra e crise política. (...) Eu vim de uma parte do Congo, onde rebeldes e milícias estão fazendo crueldades: estuprando as mulheres, as crianças, as idosas, e matando as pessoas. Eu decidi fugir com um grupo porque, voltando de uma viagem a trabalho, não conseguia mais entrar na minha cidade. E lá, se a gente ficasse, seria estuprada ou morta. O que acontece? Quando uma mulher é estuprada, ela fica fora da sociedade, é excluída, rejeitada, o que é muito difícil!(...) E lá, se você fala sobre essa situação política, você morre!... Uma pessoa amiga conseguiu o visto para a gente, e eu saí. Vim sozinha, mas, agora há pouco, consegui trazer mais dois membros da minha família. O povo do Brasil é maravilhoso! A maioria das pessoas me acolheu muito bem, foi muita receptiva. Aqui, as pessoas me levaram na Cáritas, e lá eu comecei a fazer aula, aprendi a falar Português e consegui a minha integração na sociedade, contou.
Após, o reitor do Santuário Cristo Redentor, Padre Omar Raposo, convidou imigrantes e refugiados presentes à cerimônia para uma oração plurilíngue diante do Monumento e convocou:
— Somos todos irmãos e podemos acolher bem a todos. Por isso, estejamos, como pediu o Papa Francisco durante o lançamento mundial da Campanha no Vaticano, hoje pela manhã, “justamente assim (gesticulou o Papa), com os braços bem abertos, prontos a um abraço sincero, afetuoso e envolvente”.
A cerimônia foi finalizada com a Oração Oficial da campanha, rezada por todos.
Imigração e refúgio
É fato que existe uma crise migratória provocada pelas conjunturas política, econômica, social ou causada pelos fenômenos climáticos. É preciso dar um basta às diversas formas de violação dos direitos humanos que os imigrantes e refugiados sofrem. Afinal, cerca de 230 milhões de pessoas atualmente vivem fora dos seus países de origem (migrantes internacionais). Segundo publicação do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur), no primeiro semestre de 2016, 3,2 milhões de pessoas foram forçadas a sair de seus locais de residência devido a conflitos ou a perseguições, das quais 1,5 milhão são refugiadas ou solicitantes de refúgio.
No Brasil, 9.552 pessoas, de 82 nacionalidades, já tiveram sua condição de refugiadas reconhecida. Desde o início do conflito na Síria, 3.772 pessoas desse país solicitaram refúgio em nosso País. Nos últimos meses há também um crescente número de solicitação de refúgio por cidadãos da Venezuela: apenas em 2016, 3.375 venezuelanos solicitaram refúgio no Brasil, número que representa cerca de 33% das solicitações registradas no País no ano passado. Estima-se que vivam aqui, incluindo imigrantes irregulares, refugiados e novos fluxos, cerca de 2 milhões de migrantes.
Redes Sociais
Nas redes sociais, foram lançadas as hashtags #sharejourney e #compartilheaviagem. Para participar da campanha, basta tirar uma foto de braços abertos, como o Cristo Redentor, em sinal de acolhida, e postar com as hashtags.
* Fotos: Gustavo de Oliveira